'É preciso metáfora nestes tempos em que dizer o óbvio virou crime', afirma o colunista de Oeste
É preciso metáfora nestes tempos em que dizer o óbvio virou crime. Seria um crime contra as instituições dizer que a confirmação imediata da mesa diretora da Câmara da cassação de Deltan Dallagnol foi, na verdade, um crime contra a jurisprudência mais óbvia e contra a república? Deltan combateu a corrupção desde sempre. O presidente da Câmara, Arthur Lira, se indignou com a cassação sumária do parlamentar e disse que só a Câmara tinha direito de cassar os seus. Coincidentemente após a justiça suprema botar na mesa um processo de década atrás sobre corrupção passiva, o silêncio anuente de Lira cortou a cabeça de Deltan. Coincidência? Só os ingênuos creem em coincidências políticas no Brasil. Três cânceres antigos: a chantagem, o medo e a troca de favores movem decisões da República brasileira desde sua fundação. Não matam, mas mantém o paciente em eterna sobrevida por aparelhos. Agora estes sub cânceres servem a um imperador supremo que os comanda e pode comandar o futuro cadáver obediente. Todos sabem o que ocorre. Ninguém tem coragem de dar um pio. Todos têm medo. Os poucos que falam são ceifados ou esperam a degola diante do silêncio covarde da maioria. Juristas, jornalistas, influenciadores, políticos. Quase todos com medo de expor o óbvio. Sem coragem para enfrentar o medo que cortará fatalmente suas cabeças. Assim como a própria Câmara começou por cortar lá atrás a cabeça de Daniel Silveira, hoje preso, com perdão presidencial cassado, para entregar a cabeça da autonomia da própria Câmara ao líder supremo. Medo. Covardia. E — no caso de Deltan — oportunismo em ajudar a cassar quem caçava a corrupção da maioria dos corruptos que abundam no Legislativo. A ditadura suprema tem método — ela dialoga democraticamente com os interesses escusos dos políticos que enxergam a sobrevivência de seus próprios umbigos. Todos veem isso. E fingem que não veem. Por cálculo errado ou cegueira estratégica mesmo. O câncer come solto em cima das duas patologias.
Menos metáforas. Mais realidade. Exemplo factual. Quase todos intuem que a invasão do 8 de janeiro beneficiou o governo petista e o Judiciário em seu discurso de demonização de toda a direita brasileira; todos viram o chefe do GSI recebendo e orientando as invasões; todos intuem que o governo foi alertado sobre a invasão; todos sabem que o governo adulterou documentos que alertavam sobre a invasão; todos intuem e quase todos sabem que o Judiciário supremo tinha acesso a todas estas informações. Mas a relatora da CPI destas invasões diz que quem contestar a verdade do governo e da suprema Justiça será preso. De fato: todos hoje no Brasil sabem que dizer uma verdade inconveniente ao câncer ditatorial pode custar prisão e silenciamento. Então quase todos negam dar o tratamento da quimioterapia óbvia: a verdade exposta. A verdade exposta que há um estranho arranjo entre mídia, Judiciário e governo para espalhar o câncer ditatorial em toda a República dizendo que o próprio câncer que espalham é a cura para a doença que criaram. Ora: espalhando a verdade, empunhando a verdade, o corpo brasileiro unido poderia reagir ao Estado canceroso que o destrói, uma vez que o povo unido é muito maior que qualquer estado criado para proteger este povo e que hoje está anulando seu próprio povo; que anulando os próprios pilares da democracia que jura defender.
O rei está nu. Todos veem o rei pelado. Quase ninguém tem coragem de ver o corpo putrefato do rei carcomido pelo câncer da tirania que quer devorar os olhos e a língua de todo brasileiro que enxerga — e nega — o óbvio. Enquanto não houver um que se some a outro para apontar o horror do câncer desnudado do rei, o câncer desnudado da tirania vai negar nossos olhos. E nos adoecer a todos com o câncer da covardia que abençoa a ditadura que come o corpo nu da nossa democracia destroçada. Ainda é tempo de ver, e falar com nossos olhos. E agir.
Fonte/Créditos: ADRILLES JORGE - 11 JUN 2023 08:30
Créditos (Imagem de capa): Foto: Foto: Reprodução
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